Autor: Fábio Zugman
Nossa cultura tem um caso de amor com o conformismo. Nosso país, como outros, foi feito por fugitivos que, mais que tudo, queriam pertencer a algo. Haviam perdido tudo em mudanças políticas e guerras, e queriam possuir as coisas sem chances de perdê-las novamente. Junte-se a isso a grande influência religiosa na nossa história e temos um vislumbre da aversão ao risco que nos domina.
É fácil perceber essa aversão ao diferente no modo como nos vestimos, nos comportamos e tratamos as pessoas de diferentes orientações sexuais, religiões, crenças e assim por diante. Também podemos olhar como algumas mudanças “simples" mundo afora parecem tão difíceis em nossa sociedade. Coisas que seriam “fáceis" de ser mudadas permanecem como são, em boa parte, na minha humilde opinião, pela nossa herança cultural de abraçar o conhecido e temer o novo (nada mais justo, sendo boa parte de nós herdeiros daqueles que perderam tudo antes de virem para cá).
Acabamos todos lendo os mesmos livros, usando as mesmas fórmulas, falando com as mesmas pessoas e tendo as mesmas ideias. Qual foi a última vez em que que você teve uma conversa com alguém de opinião completamente diferente à sua? Até nossos amigos são escolhidos por serem parecidos com nós. O pessoal do Google, Facebook e Amazon, entre outras, aprendeu isso faz tempo, nos mostrando cada vez mais conteúdo que vai de encontro aos nossos gostos, evitando aqueles diferentes do nosso “padrão”, contribuindo para arraigar ainda mais nossa percepção de mundo.
Não é à toa que muitos reclamam que as redes sociais têm ficado cada vez mais intolerantes…
Certa vez, li em um livro de um grande investidor que ao ter a ideia para um investimento, ele saia comentando com os colegas. Se as pessoas concordassem prontamente, ele jogava a ideia fora e começava de novo. Por que investir em uma ideia que qualquer um pode ter?
É o que gosto de chamar de fator “você deve estar louco”. Parto do princípio de que uma boa ideia pode ser simples e fácil de entender. As pessoas falam “hummm, isso pode ser bom” e depois perguntam como foi seu fim de semana. Uma grande ideia, em geral, não causa esse efeito. Pelo contrário, sei que posso ter algo realmente bom em mãos quando escuto “você deve estar louco” ao menos uma vez. Depois tentam convencê-lo de quão louco você está.
Ouvi isso algumas vezes na vida, como quando resolvi escrever um livro técnico sobre administração com vinte e poucos anos, como quando fui dar consultoria e sugeri que a empresa me demitisse, seguisse seu curso e parasse de gastar dinheiro com consultores ou, quando no auge da euforia da descoberta do pré-sal, resolvi vender todas as minhas ações da Petrobrás. Todo mundo acredita em uma coisa, você vai lá e faz outra. Deve estar louco mesmo.
Claro que em várias ocasiões eu estava certo, em outras errado. Ainda assim, as situações “você deve estar louco” foram as que me trouxeram mais resultados e aprendizado.
É algo comum que vejo em muitos executivos, empreendedores e executivos de sucesso. Geralmente, essas pessoas conseguem contar com total clareza os momentos “você deve estar louco” que mais marcaram suas vidas.
Quem nunca ouviu isso, com certeza teve um maior conforto mental. Dormiu tranquilo à noite, feliz, sabendo que aqueles à sua volta concordavam com ele.
Por outro lado, provavelmente, fez poucas coisas realmente interessantes.
Fonte: www.administradores.com.br