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terça-feira, julho 06, 2010

Gerenciar Projetos com Equipes de Alta Especialização Técnica

Autora: Liana Bleinroth

Introdução

A partir dos anos 90 minha carreira foi centrada no gerenciamento de equipes de alta especialização técnica. Através deste artigo, baseado em vivências, observações e contribuições de colegas, compartilho algumas opiniões e experiências.

A princípio, gerenciar um projeto com uma equipe de alta especialização técnica pode parecer um “porto seguro” para o gerente do projeto: não existirão desafios que não sejam superados, as metas serão seguramente cumpridas dentro dos prazos e orçamento planejados.

A experiência demonstra que um dos maiores desafios será gerenciar a equipe do projeto!
Principais desafios ao gerenciar uma equipe de alta especialização técnica

Muitos são os desafios ao gerenciarmos uma equipe de alta especialização técnica, principalmente porque a necessidade de uma equipe com essas características já é um indício de complexidade do projeto.

Se observarmos, já no início da definição da equipe técnica, onde são estabelecidos os perfis técnicos necessários e o grau de competência desejada, os candidatos que passam pelos critérios de seleção já percebem os desafios que estão por vir e se sentem orgulhosos por terem sido selecionados.

Nesse contexto, o gerente do projeto deverá se preparar para enfrentar alguns desafios que usualmente ocorrem na fase de desenvolvimento do projeto:

* Gerenciar o escopo
* Gerenciar os egos
* Gerenciar as inseguranças
* Gerenciar os conflitos internos

Gerenciar o escopo

Um projeto de alta complexidade técnica normalmente trilha por novos caminhos tecnológicos e de infraestrutura, exigindo criatividade da equipe.

A escolha de um caminho a ser adotado exige muita ponderação entre custo x benefício x prazo x risco para garantir que a proposta de solução não se desvie do escopo original.

A equipe técnica é responsável pela análise e ponderação de todos os pontos. Esse é um dos momentos de maior empolgação para os técnicos envolvidos, pois vislumbram oportunidades de novas experiências e novos conhecimentos. Surgem então as justificativas de benefícios extras, que certamente devem ser avaliados, mas com o cuidado de não tornarem-se o foco principal para a seleção de uma ou alternativa técnica.

Muitas vezes, a alternativa técnica escolhida pode desestimular a equipe. É preciso que os técnicos estejam totalmente envolvidos com o escopo do projeto relativo aos prazos, orçamento e benefícios esperados. Devem ser estimulados à pesquisa, conscientes de que esta também é uma forma de ampliar seus conhecimentos, mesmo que utilizadas parcialmente para o projeto em questão.

Para melhor exemplificar, conto aqui um caso que pude acompanhar: durante a fase de estudo do projeto, surgiu a necessidade de avaliação de ferramentas de automatização de fluxos de processos. Nesse estudo, a equipe técnica avaliou várias ferramentas, escolhendo a mais ampla e flexível, a melhor pontuada pelo Grupo Gartner, argumentando aos patrocinadores do projeto que, se utilizada para atender outros projetos, poderia justificar o retorno sobre o investimento. Levantamentos foram efetuados para identificar outros projetos candidatos a utilizar a ferramenta. Assim deu-se a aquisição das licenças: uso corporativo, extrapolando, portanto o escopo do projeto gerador da demanda. Durante a fase de desenvolvimento, verificou-se que a ferramenta, por tanta flexibilidade, exigia em contrapartida alta especialização técnica para torná-la operacional. Sua implementação não era factível em curto prazo e prazo era uma questão vital para o projeto. Os fluxos de processos foram automatizados sem a utilização da ferramenta, que acabou sendo subutilizada na corporação.

Gerenciar os Egos

Normalmente os técnicos altamente especializados são conscientes de sua competência, possuem capacidade de persuasão, são perseverantes, estão sempre em busca de ampliação de conhecimentos, novos desafios e sentem grande necessidade de reconhecimento.

Para que se mantenham motivados, precisam ter seu espaço bem determinado no projeto de tal maneira que tenham oportunidade de demonstrarem suas competências. Cabe ao gerente do projeto administrar esses espaços para que todos possam colaborar naquilo que são melhores, mantendo o equilíbrio e a motivação da equipe.

É muito comum nos técnicos altamente especializados, quando estão em busca de reconhecimento ou de oportunidades, tomarem atitudes por vezes arrogantes diante da equipe, da gerência ou mesmo do cliente. Em outros casos, podem se isolar do restante da equipe, não compartilhando seus problemas nem suas decisões, correndo o risco de se desviarem do escopo do projeto. Existem casos que, por conta de um ego exacerbado, centralizam as atividades e sobrecarregam-se ao ponto do stress.

Atitudes como essas são delicadas de serem tratadas pelos gerentes de projeto, que, muitas vezes na tentativa de controlarem a situação, alocam o técnico numa posição menos importante, o afastam do cliente, ou rebatem com a falta de atenção ou menosprezo. Essas não são as melhores maneiras de resolver o problema, porque aumentam ainda mais a ansiedade do técnico, potencializando tais comportamentos. Para resolver o problema e controlar a situação é necessária uma conversa franca com o profissional, demonstrando que esses comportamentos não estão passando despercebidos e discutindo os impactos de tais posturas diante da equipe, do cliente e da gerência.

Ainda contando casos, um excelente técnico que, com toda a franqueza que lhe era peculiar, solicitou retornar à sua equipe de origem, onde ele era a “estrela maior”. Confessou não conseguir conviver com sua condição de “planeta” na equipe em que estava alocado, onde não tinha total domínio do projeto nem controle de sua ansiedade para aguardar o tempo de se tornar “estrela”. Esse técnico passou toda a sua vida profissional na mesma equipe, como “estrela maior”, mas deixou para traz a possibilidade de ampliação de conhecimentos e evolução profissional. Infelizmente, faltou experiência e habilidade para ajudá-lo a superar essa dificuldade.

É muito importante darmos feedbacks freqüentes, sempre deixando claro o que esperamos do profissional e qual sua evolução em todo o contexto do projeto (técnica, de postura e de relacionamento).

Outro caso foi de um técnico especialista que recebeu uma missão muito complexa e crítica para o projeto. Recebeu a missão com entusiasmo e segurança. No decorrer dos dias, demonstrava sua dedicação ao trabalho, mas também certa arrogância diante dos colegas e total isolamento. Repentinamente desapareceu por alguns dias, completamente incomunicável. Ao retornar ao projeto, procurou sua gerência para conversar. Estava completamente desmotivado, com baixa autoestima, se sentindo incapaz para a missão. Durante a conversa, surgiu a oportunidade de reflexão sobre seu comportamento, seu relacionamento com a equipe, suas competências e outras competências dentro da equipe que poderiam ajudá-lo. Num trabalho conjunto, os desafios foram superados, a missão foi cumprida, intensificou-se o relacionamento com a equipe e recuperou-se a autoestima do técnico tão competente.

Embora não seja desejável que o gerente do projeto tome atitudes de falta de atenção ou menosprezo, em alguns casos elas podem ser aplicadas, principalmente quando se percebe a falta de maturidade do técnico, pois nesse caso pode servir de aprendizado. Mas o gerente precisa estar preparado para as contingências. Exemplificando um caso de falta de maturidade, na data da implantação do projeto, que ocorreria num final de semana, o técnico que desenvolveu uma das principais funcionalidades do sistema, assumiu um compromisso inadiável! O gerente do projeto não tinha justificativas para alterar a data de implantação junto ao cliente. Assumiu um risco calculado e tomou todas as providências necessárias para manter a data de implantação, alocando outro técnico com a competência adequada para assumir o suporte à implantação.

O técnico especialista percebeu que estava perdendo a oportunidade do reconhecimento e se dispôs a adiar o compromisso, mas o gerente do projeto, já preparado, manteve sua estratégia. Quando há falta de maturidade, o jogo é bem mais simples e pode ser tratado com a mesma simplicidade, porém quando o técnico tem maturidade, o jogo torna-se bem mais elaborado e exige um tratamento mais sofisticado.

Gerenciar Inseguranças

Embora a insegurança possa parecer uma postura conflitante com a postura usual de um técnico altamente especializado, sentir-se inseguro em determinadas ocasiões é bastante comum.

Geralmente, os especialistas são muito exigentes consigo mesmos e com a equipe, não assimilam bem suas próprias falhas nem a dos colegas de equipe. Quando precisam trilhar novos caminhos que podem colocar em risco sua reputação, a insegurança torna-se visível.

O gerente do projeto tem um papel fundamental nesta situação. Deve motivar os especialistas a enfrentarem os riscos, deixando-os seguros quanto ao seu apoio e o da equipe. Para isso é importante que as idéias sejam compartilhadas e aceitas pela equipe, evitando que a responsabilidade sobrecarregue apenas o idealizador.

É claro que somente o apoio não basta. Deve, em conjunto com a equipe, planejar a mitigação dos riscos, negociar e garantir o tempo necessário (suficiente mas não ilimitado) para que os especialistas testem suas soluções e, em caso de falhas, deve evitar a exposição nominal e pública.

Gerenciar os conflitos internos

Conflitos entre os membros da equipe, na defesa das melhores soluções, são bastante comuns, principalmente quando os especialistas defendem linhas conceituais ou técnicas diferentes.

Geralmente os especialistas, por sua capacidade de persuasão, tendem a “rachar” a equipe. Costumam agir silenciosamente arrebanhando seguidores.

O Gerente do Projeto deve estar atento para perceber quando a equipe está se “rachando”, porque qualquer que seja a solução adotada, se não for aceita por todos, dificilmente haverá colaboração para viabilizá-la.

Para evitar os conflitos internos, o Gerente do Projeto deve ser reconhecido como um mediador através de uma postura isenta. Deve incentivar os especialistas a apresentarem e debaterem suas idéias em equipe, preparando-os para aceitar as críticas de maneira construtiva, evitando que os expositores se sintam ganhadores ou perdedores. Para que isso aconteça, o Gerente do Projeto deve fazer com que os especialistas não exerçam apenas o papel de defensores de suas próprias idéias, mas que sejam participantes da avaliação de todas as propostas, contribuindo eventualmente para o aperfeiçoamento das mesmas e concluindo, em conjunto com a equipe, o que é melhor para o projeto.

A equipe nunca pode “rachar”! A solução escolhida deve ser consenso de todos para que os esforços sejam canalizados à realização.

Conclusão

Um projeto que exige uma equipe de alta especialização técnica é por si um projeto de alto risco, mais complexo, com mais obstáculos a serem superados e normalmente com menos referências para comparação, adotando soluções inéditas.
É muito importante que o Gerente do Projeto se prepare para enfrentar os riscos inerentes ao projeto somados aos desafios do gerenciamento da equipe, pois dele serão exigidos:

* Capacidade de liderança, com muita atenção aos sinais que as pessoas emitem, agindo com assertividade, cuidado e respeito pelas pessoas, identificando suas capacidades e limitações, aproveitando o que cada um tem de melhor a oferecer.
* Capacidade de gestão de conflitos, com motivação para resolvê-los, dispensando tempo e energia na certeza de que serão recuperados nos resultados.

Segurança e equilíbrio para enfrentar os desafios, sabendo que, se estabelecido um relacionamento de confiança entre os membros da equipe, os desafios poderão ser encarados como uma aventura: alta adrenalina e um grande prazer ao superá-los.

Fonte: http://www.pmisp.org.br/enews/edicao1006/artigo_02.asp

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